Jonas fez um série de exames e passou a freqüentar a clínica do Dr. Jacques duas vezes por semana. O médico recomendou uma vida social normal. Disse para os pais matricularem Jonas numa escola, incentivarem uma prática esportiva e a convivência com outros adolescente.
Tudo aquilo era novidade para Jonas. Mas ele, sempre frio e distante, não se excitava com nada.
Pelos anos que se seguiram, a doença não atrapalhou a vida de Jonas. Formou-se com louvor no ensino médio e fez vestibular, adivinhem, para medicina. Todos consideravam que estava curado.
Jonas seguia o plano de seus pais de se tornar um neurocirurgião e quase gostava da idéia. Seguia também, e à risca, o tratamento do Dr. Jacques, que pretendia fazer dele seu pupilo. Duas vezes por semana sentava-se na elegante sala de espera da clínica, sempre quinze minutos antes de sua consulta, lia revistas científicas e aguardava ser encaminhado pela secretária à sala do doutor e amigo.
Era assim todas as vezes. Até o dia em que Jonas chegou mais cedo. Entrou na sala de espera e, sentada na cadeira em que Jonas habitualmente se sentava estava uma moça morena, de cabelos muito negros e longos, olhos verdes que se levantaram do livro que liam e observaram Jonas por poucos e longos segundos. Ele sentiu um sono quase insuportável no momento em que aqueles olhos se cruzaram com os dele. Sentou-se rapidamente tentando controlar-se. Respirando profundamente pegou uma revista de neurociências. Não entendia uma palavra que estava ali. Na verdade, mal via as palavras. Só pensava naqueles olhos. A moça entrou no consultório e Jonas dormiu.
Passou a chegar mais cedo em todas as consultas. Muitas vezes dormia no carro, só de pensar no encontro quase sem palavras que teria com a moça dos olhos verdes. Foi assim durante muitas semanas. Chegava, cumprimentava a secretária, a moça levantava os olhos e o cumprimentava. Jonas sentia sono mas se controlava e não dormia. Minutos depois a moça saía, despedia-se dele e da secretária e ia embora. Sempre sozinha.
Já meses depois, a moça falou com Jonas. Faltou muito pouco pra que ele dormisse, mas controlou-se. Havia progredido muito no tratamento e quase sempre conseguia controlar-se. Bocejou e disse:
- O que? Desculpe-me não dormi bem...
A moça sorriu e disse:
- Tudo bem. Eu só perguntei o seu nome. A gente sempre se encontra por aqui... achei que deveríamos nos conhecer.
- Jonas. Meu nome é Jonas.
Ela levantou-se, caminhou até ele e estendeu a mão.
- Prazer. Cecília.
Jonas estendeu a mão direita a Cecília e com a esquerda tapou a boca, tentando disfarçar o novo bocejo.
Durante as semanas seguintes, a espera tornou-se muito mais interessante. Jonas e Cecília conversavam muito. Tinham vários interesses em comum, tornaram-se amigos e pareciam ambos interessados em ser mais que isso.
Num dia, depois de conversarem bastante, Cecília entrou para sua consulta. Quando saiu, ia despedindo-se de Jonas que já se levantava para dirigir-se ao consultório. Se olharam e Jonas decidiu chama-la para sair. Antes que pudesse fazer o convite, Cecília perguntou:
- Por que você vem ao Dr. Jacques?
Jonas ficou um pouco envergonhado, mas decidiu ser honesto. Já que pretendia sair com a moça, era melhor que ela soubesse logo. Então respondeu:
- Narcolepsia. E você?
Olhando pra baixo e sem conseguir disfarçar a tristeza em sua voz, Cecília respondeu:
- Síndrome de Gilles de la Tourette.
Jonas dormiu.
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